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O preocupante marasmo econômico

Continuo insistindo em que a situação da economia é altamente preocupante e que a percepção disso não está bem disseminada na sociedade, e tampouco no âmbito da classe política, que está por demonstrar capacidade de enfrentar o problema eficaz e rapidamente.

A situação é pior do que muitos imaginam. Como, por exemplo, neste trecho de reportagem deste jornal na terça-feira (15/10): “Desde o fim da recessão, a partir de janeiro de 2017 (...), era de esperar uma redução na incerteza, mas as turbulências políticas vêm impedindo essa acomodação (...)”. Ora, a economia pode não estar em recessão, conforme definida por convenção entre economistas, mas está muito pior, numa depressão que já dura cinco anos!

Como esperar uma sensível redução das incertezas que pairam no cenário econômico?

Depressão é mais grave e duradoura que recessão. Deixando de lado o economês, em 2015 a economia caiu num buraco do qual ainda não saiu. Em números redondos, no biênio 20152016, seu PIB caiu 6,0%. No biênio 2017-2018 cresceu 2,0% e, supondo mais 1% este ano, no triênio 2017-2019 terá crescido 3%. Ou seja, recuperou só metade do que perdeu no biênio 20152016.

E, ainda no buraco, apenas rasteja rumo à superfície.

Os últimos dados do PIB foram os do 2.º trimestre deste ano e mostraram que ele voltou ao seu valor do 2.º trimestre de 2012, retrocedendo sete anos! Estamos noutra das décadas perdidas que se tornaram comuns desde 1980. O pior é que a década atual, com desempenho decenal medido pela taxa média anual de crescimento do PIB, é a pior da série de dados disponíveis desde 1901!

Passando ao desempenho setorial, verifiquei que no mês passado: 1) o produto do setor de serviços estava 12% abaixo do seu nível mais alto, em novembro de 2014; 2) o da indústria geral estava 19,3% inferior ao mesmo ponto, em março de 2011; e 3) o do comércio varejista ampliado estava 9,1% abaixo do recorde da série, em julho de 2012.

Só a agropecuária ficou fora desse desastre, com destaque para a safra de cereais, leguminosas e oleaginosas, que neste ano teve novo recorde e foi 5,9% superior à de 2018. A área plantada foi 3,2% maior que a de 2018. Como a produção cresceu mais que essa área, houve aumento de produtividade, que os demais setores não conseguem entregar.

Coloquei marasmo no título acima na esperança de atrair atenção adicional para o problema. Como marasmo, meu dicionário fala de atrofia progressiva dos órgãos, como os decadentes setores apontados; uma longa enfermidade, como a prostração da economia que já dura um quinquênio; estado de apatia e falta de coragem, como mostrados pela sociedade e seus representantes políticos, respectivamente; e estagnação, que é a ausência de crescimento econômico condizente com o potencial do País. É, mesmo, o Brasil do marasmo.

Uma das manchetes da primeira página da Folha de S.Paulo anteontem também é indicativa desse estado: Economia segue errática, e apostas vão para 2020. O Brasil segue sendo o país do futuro.

Enquanto isso, Brasília continua apostando em reformas capazes de ampliar a confiança de empresários e consumidores, que, assim, acelerariam o consumo e o investimento. Mas os dados citados refletem a presença de capacidade ociosa na economia, o que contribui para retardar novos investimentos empresariais. E os consumidores sofrem com o desemprego, rendimentos estagnados e suas próprias incertezas quanto ao futuro.

Reformas tomam muito tempo na sua formulação e no trânsito pelo Legislativo. A reforma previdenciária deve ser aprovada pelo Senado só na próxima semana. E lá se foi quase um ano para concluí-la. Na reforma tributária, o governo nem sequer apresentou seu próprio projeto, e os que seguem no Legislativo têm mais de receitas simplistas do que assentadas num diagnóstico adequado dos muitos males do nosso sistema tributário. Este exige medidas muito além da ideia de agregação de impostos enfatizada por essas receitas.

Muita coisa pode ser feita na área de privatizações, concessões e outras obras de infraestrutura, mas, evidentemente, é preciso acelerar o passo. Nesse sentido, medida que me pareceu interessante foi uma do ministro Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal, que reuniu ministros do Tribunal de Contas da União e representantes dos tribunais de contas estaduais, e foi criado um grupo de trabalho para destravar investimentos na esfera do setor público que estes tribunais frequentemente impedem ou atrasam com suas decisões. Vamos ver se funciona.

Nos últimos dois meses o governo federal acenou com os imensos recursos esperados do leilão de áreas do pré-sal outorgadas à Petrobrás, nas quais há muito mais petróleo do que o total que ela acertou com o governo. Ótimo, mas será preciso assegurar que todo esse dinheiro não leve, com seu alívio passageiro, à procrastinação de medidas de ajuste, como é praxe em Estados e municípios que levarão um bom pedaço do valor desses leilões.

Diante deste quadro, e com a precária situação das finanças públicas impedindo o uso eficaz da política fiscal para estimular a economia, em vários artigos neste espaço preguei o recurso à política monetária, que não sofre dessas limitações. Isso mediante liberação robusta dos depósitos compulsórios que os bancos mantêm no Banco Central, mas voltada para financiamentos habitacionais. E, da mesma forma, um afrouxo monetário na linha do quantitative easing, utilizado por outros países no enfrentamento de crises e que no mês passado voltou a ser praticado pelo Banco Central Europeu.

Minha pregação não tem sido ouvida, mas continuarei insistindo, como hoje ao falar no Congresso Brasileiro de Economia, mesmo diante deste marasmo que também não favorece a adoção de outras ideias pela política econômica do País.

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